domingo, 28 de novembro de 2010

Dizem que o perigo está sempre a espreitar…

(parte 4 de 7)

Cada ser humano deve desenvolver-se a si mesmo, dar o seu melhor, viver  a vida   como uma viagem a empreender, com riscos e desafios. É um processo continuado e, quando na história da nossa infância há processos mal amados, tudo se torna mais difícil, concordas comigo?
Para cuidar as descobertas feitas, Elisha foi participando em momentos de partilha, de escuta e reflexão (com textos para meditar). Íamos cuidando o terreno, na esperança de mais tarde as sementes ganharem espaço e germinarem.
Não é fácil acompanhar alguém que da sua família não recebeu a segurança, a estima que precisa para ser feliz! Quantas máscaras se vão pondo, no processo de crescimento? Como resposta  às agressões da vida, mesmo de forma inconsciente, surge uma, e mais outra. E sem dar conta, um castelo vai sendo construído para não mostrar os sentimentos. E os medos vão levantando muros. Contudo, nada nem ninguém calará o desejo de descobrir a verdadeira identidade: Quem sou eu? Para que fui criado/a?
Num dia do mês de Maio, a jovem estava de novo sem forças para lutar, pois as dificuldades exteriores - uma situação problemática relacionada com o apartamento onde vivia e com a vivência do seu namoro - empurravam-na para um beco sem saída. A solução que procurava era isolar-se, fechar-se em casa … A tristeza e a confusão invadiam de novo o seu coração. Assim, o mal estar físico e psíquico foi-se avolumando. A tentação de desaparecer tomava os seus pensamentos e bloqueava a sua mente. A semente da espiritualidade ainda estava atrofiada.
A nossa vida é uma história em movimento e Aquele que nos conhece fez-me ler um livro escrito há muitos anos, por pessoas que buscavam respostas para um sentido mais forte na sua vida. Então li…
«Vês-me quando caminho e quando descanso (…) Tu me envolves e sobre mim colocas Tua mão. É uma sabedoria profunda, que não posso compreender (…)Tu modelaste as entranhas do meu ser, (…) Tu conheces-me, guia-me pelo caminho certo. » Sl139 . Chegar a ter clara esta certeza, dá um chão à vida. E Deus aguarda que possamos colaborar, que queiramos deixar-nos curar. Ele deseja que façamos a descoberta do valor e da plenitude, que pode ter a nossa vida…e da companhia da qual podemos desfrutar.
Como pode uma pessoa ter amor para dar, se na sua história de infância e adolescência foi defraudada de um amor incondicional, de vida dialogada? Quem na sua infância/adolescência, vive muitas vezes o “isolamento interior”, antes de ter aprendido a confiança e a esperança; na vida de jovem experimentará muitos receios. O vazio que ficou não é bom conselheiro! Como posso dar-me nos relacionamentos interpessoais de forma saudável se nunca me mostraram, ou não me deram a saborear, um Amor para lá dos limites humanos, que não se esgota, que é gratuito e fiel?
«Deus enviou ao mundo o Seu Filho para que vivamos por meio dele. E nisto consiste o amor, não fomos nós que amámos primeiro mas Ele amou-nos primeiro.»1Jo.4, Sim, Amigo e Conselheiro, mais um convite me fazes para “abrir a pestana”, para que me deixe envolver por esta certeza do Teu Amor. E , a partir desta rocha firme, eu e outras pessoas poderemos acorrer a vidas concretas, para, no seu caminho, descobrirem a sua identidade. Que bom será quando, nas fragilidades humanas, formos “limpando” o nosso tecido emocional! Assim, poderemos descobrir a assinatura mais valiosa que tem cada um:
 «És meu filho/a muito amado/a, em quem me alegro.»Mt.3 Esta é a assinatura mais valiosa que tem a nossa vida, já a descobriste? Queres procurar?
Senhor, Tu alegras-te com as nossas vidas?! Que boa notícia! Poucas são as pessoas que se alegram com a nossa vida, principalmente quando não somos perfeitos, quando caímos uma e outra vez. Porém, o Teu Amor é diferente…pode devolver-nos um coração jubiloso! Ajuda-me para que Elisha descubra esta qualidade de Amor. Não nos desampares.
A 30 de Maio, durante a tarde e noite, eu e um casal amigo , o L. e a M., vigiámos …estivemos de perto até de manhã cedo, para que pudéssemos proteger a fragilidade da Elisha. No dia seguinte, fomos a um médico. Fazia confusão ver a apatia em que se encontrava. Medicação e medicação, interrompia um ou dois meses e lá voltava de novo à dependência: isto custava-me… Mas até chegar a dar outro passo, teria de ir por aqui, pois a sua mente e emoção estavam mal e corria perigo de vida.
Três dias depois, Elisha marcou um momento surpresa com os amigos que tinham estado com ela na noite escura…Num tom de voz delicado, expressou sentimentos, proferiu uma mensagem de gratidão. Num gesto simbólico, bonito, ofereceu-nos uma estrela com os nossos três nomes, explicando que nessa tarde e noite fomos a estrela que Deus enviou para a proteger… Assim, estava ali, pois precisava da nossa amizade e perseverança.
Eu estava menos receptiva que a outra amiga, a M., pois sentia-me cansada. Precisava de recuperar forças e vigor, algo bloqueava os meus sentimentos. E como me estava a ser difícil estar assim, que sensação estranha…! Depois de um tempo de silêncio, eu disse:
“Peço desculpa, mas parece que tenho dentro de mim um bloco de gelo, sinto uma barreira, é como se eu não soubesse acolher este teu gesto delicado!”
A M. conseguiu dizer :
“É a primeira vez, em cinco anos de amizade, Elisha, que tens um gesto assim. E é bonito da tua parte. Mas será para continuar?...”
 Aí, tornei-me consciente do medo que se tinha instalado em mim. Meu Deus, não me reconheço! Medo de perder, medo que fosse só um momento de lucidez e depois tudo voltasse ao antigo. Que insegurança! De repente, dei conta que as vezes em que Elisha quis e desistiu, estavam agora ali, diante de mim. Enfrentei o meu sentir… olhei de frente o medo. Depois, apercebi-me que o que eu mais gostaria de ver era Elisha aceitar dar um outro passo. Um passo para se deixar ajudar numa terapia mais específica.
Ui!! Fez-se luz! Alguém a quem eu chamo Deus estava a fazer-me sentir uma barreira um pouco parecida, provavelmente, com a que ela sentia, noutras vezes, para comunicar e expressar sentimentos, não conseguindo sair desse aperto. De que tamanho seriam as suas barreiras e de que seriam feitas? Precisei fazer memória da Palavra que me tinha trazido até ali. Precisava de ser paciente. Então, restabeleci a confiança e meu coração abriu-se àquele momento: agradeci a iniciativa dela e valorizei a sua tentativa!
“Elisha, que passo positivo este de vires ao nosso encontro! Este episódio mostra que és capaz  de reconhecer a amizade fraterna e que podes avançar em direcção a mais luz!”
O perigo, desta vez, também espreitou em mim. Somos de verdade frágeis, mas levamos um tesouro: «trazemos porém este tesouro em vasilhas de barro, para que se veja que o poder é de Deus e não nosso.» 2Cor.4,7
Meu Deus, estas palavras desceram ao meu coração. Como é importante descobrir-Te como Alguém que me convida a olhar mais para o tesouro do que para a vasilha! E, a partir desta experiência, ajudar outros a fazê-lo. Como é bom sentir-Te perto, quando a noite se acerca bem dentro de nós! Os nossos limites não podem fazer-nos pessimistas. Como é favorável conhecer os Teus Sinais para assim me deixar amar e conduzir, nesta missão que me confias! Missão que não é minha, mas Tua, porque toda a realidade humana tem dignidade. Que gozo apreender que na vida quotidiana podemos contar com a Tua Presença e Companhia, basta estar(mos) atenta(os) aos Teus SMS e procurar ser fiel…
O perigo espreitou na vida de Elisha, mas Tu, Senhor, convidaste três pessoas para estarem ao seu lado e não sucumbir na sua angústia. De facto, Tu és um Deus atento a tentar resgatar-nos a vida. Obrigada!

domingo, 14 de novembro de 2010

E poderás então dizer … “ Hoje eu aprendi!”

(parte 3 de 7)


Animada com a esperança de que esta jovem pudesse participar no encontro “Páscoa Fraterna”, propus-lhe este meio para cuidar a parte espiritual. Também lhe propus que participasse numa formação humana intitulada “ Descobre-te a ti mesmo. Neste processo de acompanhamento, de caminhar ao lado de …”, tive de buscar muitas vezes alimento e luz, para saber por onde ir, como interpretar os sinais, como encaminhar…
« Revesti-vos da armadura de Deus,(…)porque não é contra os seres humanos que temos de lutar,  mas contra os Principados, e Dominadores do mundo das trevas…» EF.6, 10-13
Que me queres dizer com isto Senhor?
O mal não procede das circunstâncias externas, mas do modo como essas situações tocam o interior da pessoa. O inimigo não está fora …mas dentro alojado nos medos e complexos que nos bloqueiam. Pois sim, vejo que me queres confirmar a verdade de que, existem muitos obstáculos a minar o terreno dos afectos… Quanta insegurança e ansiedade? Quantas dúvidas de si mesma? E quantos outros jovens se sentirão assim?
Fomos tomar um café e usufruir de um espaço de conversa.
E.- Vou deixar de tomar medicação, estou farta disto. Quero ser uma pessoa “normal”. Eu sei que há três ou quatro pessoas como tu, dos grupos fraternos, que mostram gostar de mim, mas como pode ser, se eu em relação a mim sinto tanta insegurança?!
-Sabes, as emoções, onde necessitas saber “navegar”, são realidade que ainda precisas aprender a conhecer para enfrentar. Tem que ser um processo gradual, continuado, para cuidar diferentes aspectos da tua personalidade. Mas tu podes conseguir.
E. -Eu quero saber cuidar, saber estar de modo diferente na vida. Preciso de saber tomar decisões. Quero colocar alguns meios.
-Por aí,(com esse modo de pensar) estás a ir bem. Precisas conhecer-te, equipares-te para treinares aspectos positivos, para chegares a ter de ti mesma uma imagem ajustada. Porém, nos primeiros tempos, deixares-te ajudar é sinal de sabedoria, não de fraqueza, sabias?
Ela aceitou as propostas e participou em cada uma, a seu tempo. Na formação humana (pedagogia e psicologia), podia ir sozinha, mas na outra proposta, tive de procurar apoio. Assim, pedi para alguém a acompanhar no momento “Páscoa Fraterna”, mas disseram-me que já não havia disponibilidade para tal... Custou-me aceitar esta realidade. Aí, senti-me pobre, e disse para mim mesma: “Porque sonhas, alma minha? Que mania tens de sonhar alto! Raios!” Depois alguém me dizia:
T- só se fores tu a acompanhar.
Senti receio desta possibilidade. Mas, dentro de mim, uma proposta ecoava: “Procura-Me…agora que me podes encontrar, procura-Me, que estou perto
Então, decidi participar numa eucaristia e acolher a Palavra que me seria dirigida, na busca de saber decidir. E, a dada altura, ecoava no meu interior: «E agora o Senhor declara-me que me formou desde o ventre materno, para ser o seu servo, para lhe reconduzir Jacob »Is.49, 5
Olhando para Maria, mulher da nossa raça, mulher e educadora, dei conta que seria importante conceder-me um tempo e guardei estas palavras uns dias, no meu coração. Passei a sentir nesta palavras a firmeza de uma âncora e orientação de um farol. Era como se eu fosse levada para uma aventura em alto mar! Deixei-me estar a saboreá-las uns dias…
Mas, com receio de que a minha vontade não chegasse para entender a Vontade do Mestre do Amor, dias depois fui participar noutro momento de enriquecimento interior. Necessitava reencontrar a linha condutora para depois agir. Eis, que a dado momento escutei: ««não basta que sejas meu servo, (…)vou fazer de ti luz das nações para que a minha salvação chegue aos confins da terra.»Is.49, 6

Foi então que decidi acompanhar a Elisha, nesse fim semana, para que ela se pudesse encontrar com Aquele que é Fonte do Amor, da Confiança e da Paz.
Foi também um outro jovem de um dos grupos a esse encontro. Foi muito rico, permitindo-nos uma possibilidade de crescimento interior.
A mim, fez-me experimentar a Mão de quem me guiava, e fez-me dar conta do quanto já tinha eu recebido em momentos destes, naquelas pessoas que me apoiaram na busca de caminhos interiores. Saboreei a alegria de ver alguém reencontrar-se na sua história, história com valor, com possibilidade de descoberta de “tesouros escondidos”.
No final deste tempo de paragem -“Páscoa Fraterna”-Elisha escrevia:
“Agora eu percebi quem esteve diante da minha Cruz, em tantos momentos, sem nunca me abandonar. Agora eu pude reconhecer Quem esteve com esperança, diante dos túmulos de sobrevivência por onde andei. Pude distinguir quem me enviou para me ajudar: «Entrego por ti, pessoas, ….porque és preciosa aos meus olhos.»Is.43,4   para ainda hoje estar aqui.
Quanto a mim, que gratidão levo dentro, nem consigo explicar, mas posso dizer: “Quero ir por aqui, para mais descobertas de vida!”
De regresso a casa partilhávamos:
- Sabes, Elisha, agora eu aprendi que viver é uma aventura diária, na qual não sei o que vai acontecer, quem surge no meu caminho, mas preciso redescobrir a segurança de ser acompanhada, pelo Mestre da Vida, nas circunstâncias que me vão envolver. Que poderás tu dizer, após estes dois dias de exercícios espirituais que constituíram uma paragem na tua vida?
E.-A paz recebida faz-me mais leve por dentro e a alegria é um fruto saboroso que levo. Aprendi que preciso de muito alimento para cuidar as minhas feridas devidas à falta de reconciliação com o meu passado.
 -Essa alegria mais profunda, quer abraçar todo o teu ser, mais vezes (e de cada pessoa que dê a si mesma estas oportunidades).